quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

PSICOLOGIA AFETIVA E A SUA PRÁTICA CLÍNICA

INTRODUÇÃO

A Psicologia Afetiva é um campo que investiga o papel das emoções, vínculos e experiências afetivas no desenvolvimento humano e na prática clínica.

Sua aplicabilidade na clínica está intrinsecamente ligada à compreensão de como os padrões emocionais, especialmente aqueles formados na infância, influenciam a saúde mental e as relações interpessoais ao longo da vida.

Abaixo, discorro sobre seus fundamentos e aplicações, com base nos contextos fornecidos:

1. FUNDAMENTOS TEÓRICOS DA PSICOLOGIA AFETIVA

A Teoria do Apego, desenvolvida por John Bowlby e Mary Ainsworth, é um pilar central da Psicologia Afetiva. 

Mary Ainsworth postula que os vínculos estabelecidos na infância com figuras de cuidado moldam os "modelos internos de funcionamento", que orientam como o indivíduo interpreta e responde a situações emocionais ao longo da vida. Esses modelos influenciam desde a regulação emocional até a capacidade de estabelecer relações seguras na idade adulta.

No livro A Clínica do Apego, Marco Mendes sintetiza estudos nacionais e internacionais sobre o tema, destacando a necessidade de integrar a teoria à prática clínica. 

A obra divide-se em partes teóricas (como a etologia do apego e os estilos de vinculação) e práticas, que orientam intervenções terapêuticas baseadas na criação de uma "base segura" para o paciente.

2. APLICAÇÕES NA CLÍNICA PSICOLÓGICA

a) Psicoterapia Afetiva e Relacional

A Psicologia Afetiva propõe intervenções que priorizam a reparação de vínculos e a regulação emocional.

 Por exemplo:

Terapia Focada nas Emoções (TFE):

Abordagem desenvolvida por Les Greenberg e aplicada por Marco Mendes, que utiliza técnicas para identificar e reprocessar emoções mal adaptativas, como raiva ou medo, promovendo mudanças profundas nos padrões afetivos.

Criação de "Porto Seguro":

O terapeuta assume o papel de figura de apego, oferecendo acolhimento e estabilidade emocional, o que facilita a exploração de conflitos internos pelo paciente. 

b) Integração com Outras Abordagens

A clínica afetiva não se limita a um único modelo. Mendes propõe uma psicoterapia integrativa, combinando elementos da Terapia Cognitiva, Fenomenologia e Psicodinâmica.

Isso permite abordar tanto os aspectos cognitivos quanto as experiências subjetivas do paciente, como destacado no capítulo. 

A Clínica do Apego trata dos fundamentos para uma psicoterapia experiencial e integrativa.

c) Influência no Raciocínio Clínico

Pesquisas destacam que o afeto do próprio terapeuta pode influenciar diagnósticos e decisões clínicas.

Por exemplo, emoções negativas (como ansiedade) podem levar a erros de avaliação, enquanto a consciência afetiva permite intervenções mais precisas. 

Estratégias como a auto-observação e a supervisão são essenciais para mitigar esses vieses. 

3. CRÍTICAS E DESAFIOS

Apesar de seus avanços, a Psicologia Afetiva enfrenta desafios históricos.

A psicopatologia tradicional priorizou distúrbios cognitivos e perceptivos, relegando a afetividade a um papel secundário. 

Como aponta Berrios, a falta de uma semiologia clara para os transtornos afetivos dificultou sua descrição precisa, levando a descrições metapsicológicas abstratas (e.g., afeto como "energia") em vez de análises fenomenológicas.

Além disso, a fenomenologia hermenêutica (baseada em Heidegger) critica a visão reducionista das emoções como "objetos" mensuráveis, defendendo uma abordagem que considere a existência humana em seu contexto histórico e relacional. 

4. CASO CLÍNICO ILUSTRATIVO

Em um sistema terapêutico-investigativo descrito por Vieira Filho, uma pesquisadora iniciante enfrentou conflitos emocionais ao coordenar atendimentos.

A análise de sua implicação psicoafetiva (emoções, valores e representações) revelou como sua ansiedade influenciava a escolha de técnicas. 

A supervisão permitiu transformar essa implicação em um "terceiro incluído", evitando a reificação das análises e promovendo intervenções mais adaptativas. 

5. FUTURO E PERSPECTIVAS

A Psicologia Afetiva tende a se expandir com:

Tecnologias de Regulação Emocional:

Uso de biofeedback e realidade virtual para treinar habilidades afetivas.

Intervenções Preventivas:

Programas baseados em apego para famílias em risco social. 

Integração Interdisciplinar:

Diálogo com neurociências para mapear correlatos neurais das emoções. 

CONCLUSÃO

A Psicologia Afetiva revoluciona a clínica ao reconhecer que as emoções não são meros sintomas, mas eixos centrais da experiência humana.

Sua aplicabilidade exige do terapeuta não apenas conhecimento teórico, mas também autoconsciência afetiva e flexibilidade para adaptar técnicas às necessidades singulares do paciente.

Como sintetiza Mendes, "a clínica do apego é, antes de tudo, uma clínica do encontro".

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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CAMPOS, Dinah Martins de Souza. Psicologia da aprendizagem. 34. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.

FELDMAN, Robert S. Introdução à Psicologia. 10. ed. Porto Alegre: Artmed, 2015.

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GAZZANIGA, Michael et al. Ciência psicológica. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2018.

GOLDANI, Ana. Desenvolvimento, emoção e relacionamento na escola. Rio de Janeiro: E-papers, 2010.

 LAKOMY, Ana Maria. Teorias cognitivas da aprendizagem. Curitiba: InterSaberes, 2014.

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