segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

EFEITO IATROGÊNICO NA CLÍNICA DE PSICOLOGIA

 


INTRODUÇÃO

O efeito iatrogênico refere-se aos danos ou consequências negativas provocadas por intervenções terapêuticas, incluindo aquelas realizadas em contextos psicológicos e psicoterapêuticos.

A iatrogenia pode surgir devido a diversos fatores, tais como: excessiva identificação com o papel de paciente, quebra da relação de confiança com o terapeuta, re-traumatização, excessiva medicalização e falta de habilidade do profissional.

Este fenômeno é particularmente relevante para a prática clínica, pois destaca a necessidade de uma abordagem cuidadosa, ética e baseada em evidências.

Este documento explora como o efeito iatrogênico pode ocorrer na psicologia e psicoterapia, enfatizando exemplos práticos, aspectos éticos e soluções para prevenção.

DEFINIÇÃO:

O termo “iatrogênico” na área da psicologia refere-se aos impactos adversos resultantes de intervenções terapêuticas inadequadas, mal planejadas ou realizadas sem consideração às necessidades do paciente.

Isso inclui efeitos colaterais emocionais, agravamento de sintomas ou surgimento de novos problemas psicológicos.

ORIGEM E AUTOR DO TERMO

O conceito de iatrogenia foi adaptado para a psicologia a partir da medicina, com o termo popularizado por teóricos como Ivan Illich.

No contexto psicoterapêutico, estudiosos como Donald Winnicott e Carl Rogers contribuíram para a compreensão da relação terapeuta-paciente e os riscos associados.

PRINCIPAIS TEÓRICOS

Donald Winnicott:

Discutiu como intervenções intrusivas podem desestabilizar o desenvolvimento emocional de pacientes, especialmente crianças.

Em sua obra "A Natureza Humana", Winnicott destacou como intervenções intrusivas e mal conduzidas podem desestabilizar o desenvolvimento emocional de pacientes, especialmente crianças.

Ele afirmava que "o cuidado suficientemente bom permite que o paciente desenvolva um verdadeiro self, enquanto a negligência ou intrusão pode gerar um falso self".

Carl Rogers:

Enfatizou a importância da empatia e do respeito à experiência subjetiva do paciente para evitar danos.

No livro "Tornar-se Pessoa", Rogers enfatizou que "a terapia só é eficaz quando o terapeuta é genuíno, aceita incondicionalmente o cliente e compreende empaticamente sua experiência".

Ele alertou sobre os perigos de abordagens que desconsideram a subjetividade do paciente.

Aaron Beck:

Abordou o impacto de interpretações inadequadas ou técnicas cognitivo-comportamentais mal aplicadas.

Em "Terapia Cognitivo-Comportamental: Teoria e Prática", Beck discutiu como interpretações inadequadas ou a aplicação de técnicas fora do contexto do paciente podem gerar resistência ou agravamento dos sintomas.

Irvin D. Yalom:

Destacou a importância da autêntica conexão entre terapeuta e paciente para prevenir efeitos adversos na psicoterapia.

Yalom, em "Teoria e Prática da Psicoterapia em Grupo", abordou como a falta de conexão autêntica entre terapeuta e paciente pode levar a uma sensação de alienação e aumentar o sofrimento emocional.

Segundo ele, "a ausência de autenticidade no terapeuta compromete a essência do processo terapêutico".

Ivan Illich:

Em "A Expropriação da Saúde", Illich alertou sobre os riscos da medicalização excessiva, aplicável também à psicologia.

Ele sugeriu que "o excesso de intervenções pode obscurecer o potencial humano para enfrentar e superar desafios de forma autônoma".

COMO O EFEITO IATROGÊNICO OCORRE NA PSICOLOGIA

Diagnósticos precipitados:

Um psicólogo pode rotular erroneamente um paciente com um transtorno que não possui, levando a intervenções inadequadas.

Intervenções mal planejadas:

Uso de técnicas não baseadas em evidências ou fora do contexto do paciente.

Relação terapêutica inadequada:

Falta de empatia ou excesso de autoridade podem criar um ambiente inseguro para o paciente.

Excesso de exploração de traumas:

A abordagem de temas sensíveis sem preparo pode retraumatizar o paciente.

Falta de contextualização sociocultural:

Ignorar fatores culturais e sociais pode levar a intervenções irrelevantes ou prejudiciais.

EXEMPLOS NA PRÁTICA CLÍNICA

Uso da retraumatização excessiva:

Um terapeuta que insiste em relembrar eventos traumáticos com um paciente que não está emocionalmente preparado pode exacerbar sintomas de transtorno de estresse pós-traumático.

Uso de técnicas onde o paciente é exposto:

Uso de técnicas de confronto em terapia de grupo que levam pacientes a se sentir expostos e desamparados.

Aplicação de testes fora da contextualização do paciente:

Aplicação de testes psicológicos padronizados sem considerar adaptações culturais, levando a diagnósticos errôneos.

IMPACTO NO BEM-ESTAR DO PACIENTE:

Emocional:

Sentimentos de desamparo, frustração e aumento da ansiedade.

Social:

Isolamento devido à desconfiança em profissionais ou abordagens terapêuticas.

Cognitivo:

Criação de crenças disfuncionais sobre si mesmo e sobre a eficácia da terapia.

Comprovações Científicas:

Pesquisas publicadas no “Journal of Clinical Psychology” apontam que até 15% dos pacientes relatam piora nos sintomas após iniciar psicoterapia inadequada.

Estudos mostram que a falta de aliança terapêutica é um dos principais preditores de insucesso terapêutico.

Relatórios da Organização Mundial da Saúde (OMS) destacam a importância de abordagens culturalmente sensíveis para minimizar danos.

PREVENÇÃO:

Formação adequada:

Psicólogos devem receber treinamento constante em boas práticas.

Supervisão:

Discussão de casos clínicos com colegas experientes pode evitar erros.

Aliança terapêutica:

Construir relações baseadas na empatia e no respeito ao paciente.

Técnicas baseadas em evidências:

Priorizar abordagens validadas cientificamente.

Sensibilidade cultural:

Adaptar intervenções às particularidades do paciente.

CONCLUSÃO

O efeito iatrogênico na psicologia e psicoterapia destaca a importância da reflexão crítica e da atuação ética.

Profissionais devem buscar formação e supervisão constantes para evitar danos aos pacientes, promovendo intervenções seguras e eficazes.

Reconhecer e abordar os riscos da prática clínica é essencial para o avanço da área e para o bem-estar dos pacientes.

Além disso, a integração de abordagens sensíveis ao contexto cultural e social dos pacientes reforça a eficácia e a relevância das práticas terapêuticas.

 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1.     BECK, Aaron T. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2013.

2.     BERWICK, Donald M. Erros médicos: prevenção e controle. Porto Alegre: Artmed, 2007. 

3.     ILLICH, Ivan. A expropriação da saúde: némesis da medicina. São Paulo: Nova Fronteira, 1975. 

4.  ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Relatório sobre saúde mental e bem-estar global. Genebra: OMS, 2021. 

5.     ROGERS, Carl. Tornar-se pessoa. São Paulo: Martins Fontes, 1997. 

6.     WINNICOTT, Donald W. A natureza humana. Rio de Janeiro: Imago, 1990. 

7.     YALOM, Irvin D. Teoria e prática da psicoterapia em grupo. Porto Alegre: Artmed, 2006.

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