A
memória é um dos pilares fundamentais para o funcionamento cognitivo,
influenciando diretamente o aprendizado, a identidade pessoal e o comportamento
humano.
A capacidade de armazenar, reter e recuperar informações é essencial para a sobrevivência e para o desenvolvimento das atividades diárias.
Contudo, esse processo não é infalível, estando sujeito a diversas influências que podem comprometer sua eficiência.
Entre essas influências, destaca-se a Teoria da Interferência, que explica como a sobreposição de informações pode prejudicar a memória, afetando não apenas a aprendizagem acadêmica, mas também aspectos clínicos e terapêuticos.
Compreender a interferência é essencial para otimizar os processos de ensino-aprendizagem, aprimorar abordagens terapêuticas e desenvolver estratégias eficazes para reduzir seus efeitos negativos.
CONCEITO
E DEFINIÇÃO
A Teoria da Interferência postula que o esquecimento não ocorre apenas pelo simples decaimento do traço de memória ao longo do tempo, mas também devido à competição entre informações armazenadas.
Quando novas informações entram em conflito com as antigas, a recuperação pode ser prejudicada, dificultando o acesso a memórias específicas. Essa teoria desafia a ideia tradicional de que a memória falha apenas por degradação do traço mnésico, introduzindo a noção de que diferentes memórias podem competir entre si dentro do sistema cognitivo.
TIPOS
DE INTERFERÊNCIA
INTERFERÊNCIA
PROATIVA:
Ocorre
quando informações antigas prejudicam a retenção de novas informações. Isso
ocorre frequentemente quando há similaridade entre os conteúdos, causando
confusão na recuperação das memórias.
Exemplo:
Um estudante que aprendeu espanhol pode ter dificuldade em aprender italiano, confundindo palavras entre os idiomas devido à similaridade fonética e gramatical.
INTERFERÊNCIA
RETROATIVA:
Ocorre quando novas informações dificultam a recuperação de informações antigas, reduzindo sua acessibilidade. Esse efeito pode ser agravado por eventos emocionais ou estresse cognitivo.
Exemplo:
Um profissional que troca de senha bancária frequentemente pode ter dificuldade em lembrar senhas antigas devido ao impacto das novas informações sobre as anteriores.
CARACTERÍSTICAS
E BASES CIENTÍFICAS
A interferência está fortemente relacionada à neurociência cognitiva, especialmente nas interações entre o hipocampo e o córtex cerebral.
Estudos de neuroimagem demonstram que a memória é um sistema dinâmico, influenciado por fatores emocionais, contextuais e biológicos.
A plasticidade sináptica desempenha um papel essencial na capacidade do cérebro de formar e consolidar memórias duradouras.
Em particular, o lobo pré-frontal é responsável pela inibição de informações irrelevantes, reduzindo a interferência e promovendo uma recuperação mais eficiente.
APLICABILIDADE
DA TEORIA
1.
No Geral
A Teoria da Interferência explica fenômenos cotidianos, como esquecimentos frequentes e dificuldades de recuperação de informações sob estresse.
Situações de sobrecarga cognitiva, comuns em ambientes de alta demanda mental, tendem a acentuar os efeitos da interferência.
2.
Na Aprendizagem
No contexto educacional, a interferência pode dificultar a retenção de informações, especialmente quando o conteúdo é similar.
Professores e alunos podem adotar estratégias para minimizar esse impacto, como espaçamento de estudo, revisões periódicas e intercalação de matérias.
3.
Na Neuropsicanálise
Na neuropsicanálise, a interferência pode estar associada a mecanismos de recalque e resistência.
A dificuldade de acessar memórias reprimidas pode ser explicada pela interferência de novos eventos, que dificultam a emergência do conteúdo inconsciente.
4.
Na Psicanálise e Psicoterapia
Durante a análise, pacientes frequentemente relatam dificuldades em recordar eventos passados devido à interferência retroativa.
A
compreensão dessa dinâmica ajuda terapeutas a abordar resistências e facilitar
o acesso a memórias reprimidas, promovendo uma maior elaboração psíquica.
ESTRATÉGIAS PARA REDUZIR A INTERFERÊNCIA
Estudo
distribuído:
Sessões de estudo espaçadas minimizam a sobrecarga cognitiva.
Prática
de recuperação:
Testes periódicos fortalecem a consolidação da memória.
Alternância
de conteúdos:
O aprendizado intercalado melhora a retenção a longo prazo.
Técnicas
de visualização:
Imagens mentais favorecem a associação de informações e reduzem a interferência.
CONCLUSÃO
A Teoria da Interferência representa um dos mais importantes modelos explicativos sobre o esquecimento humano, com implicações que vão desde a educação até o campo clínico.
Ao entendermos como a interferência ocorre e quais são suas consequências, podemos criar estratégias para mitigar seus efeitos e potencializar o aprendizado, a memória e a eficiência terapêutica.
O avanço das pesquisas em neurociência continua a esclarecer os mecanismos envolvidos na memória, possibilitando novas abordagens para otimizar o funcionamento cognitivo e emocional dos indivíduos.
BIBLIOGRAFIA
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