INTRODUÇÃO
O estudo da memória e dos processos de aprendizagem tem sido central na neurociência e na psicologia.
Um conceito fundamental nesse campo é o engrama neural, que se refere às alterações físicas no cérebro associadas ao armazenamento de memórias.
O engrama neural é um conceito que se
refere às representações físicas e químicas de uma memória no cérebro.
Em outras palavras, é a marca deixada
no sistema nervoso quando uma informação é aprendida e armazenada. Essas marcas
podem envolver mudanças em sinapses, padrões de atividade neural e modificações
na estrutura dos neurônios.
Compreender os engramas neurais é
essencial para desvendar os mecanismos da memória e aprimorar abordagens
terapêuticas na psicoterapia.
CONCEITO DE ENGRAMA
NEURAL
O termo "engrama" foi
introduzido pelo biólogo alemão Richard Semon no início do século XX,
descrevendo-o como uma marca física deixada no sistema nervoso por uma
experiência.
Na neurociência moderna, um engrama é entendido como a
representação física de uma memória no cérebro, envolvendo alterações nas
conexões sinápticas e na atividade neural. Essas alterações permitem que
experiências passadas sejam armazenadas e posteriormente recuperadas.
AS CÉLULAS ENGRAMA – PROCESSO DE
AÇÃO
Os engramas são como redes
multiescala de neurônios, onde uma experiência é armazenada como uma memória
potencialmente recuperável. Isso ocorre quando as células neuronais excitadas
no hipocampo ou amígdala, são recrutadas para um conjunto-local.
Os conjuntos combinam-se com outros em regiões
como o córtex, uma estrutura conhecida como ‘complexo de engrama’. Este
processo denomina-se “plasticidade sináptica” e “formação de coluna
dendrítica”.
As memórias são inicialmente armazenadas em um
complexo de engrama podendo ser recuperadas por sua reativação que por sua vez
também pode persistir silenciosamente mesmo quando não recuperadas
naturalmente.
Quando temos uma nova experiência, as células nervosas
engramas codificam os detalhes da memória que podem ser reativados quando
lembramos.
Mudanças da cromatina, estrutura comprimida que
consiste em DNA e histonas, proteínas também na estrutura do DNA, controlam o
quão ativos genes específicos estão em determinada célula.
No momento da memória, a cromatina torna-se mais
frouxa, permitindo a acessibilidade do DNA. A cromatina é um conjunto de fios
(cromossomos) em que cada um é formado por uma longa molécula de DNA associada
às moléculas da proteína histona.
AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DOS ENGRAMAS NEURAIS INCLUEM
Distribuição em Redes
Neurais:
Engramas não estão confinados a um
único neurônio, mas são distribuídos por redes de neurônios interconectados.
Plasticidade Sináptica:
A formação de engramas envolve
mudanças na força das sinapses, conhecidas como plasticidade sináptica, que são
fundamentais para a consolidação da memória.
Ocorrem mudanças na força das conexões
entre neurônios, um processo conhecido como potenciação de longo prazo (LTP).
Especificidade e
Estabilidade:
Embora específicos a determinadas
experiências, os engramas podem ser estáveis ao longo do tempo, permitindo a
retenção de memórias por períodos prolongados.
Atividade Neural Específica:
Conjuntos específicos de neurônios são
ativados quando uma memória é evocada.
Alterações Estruturais:
A criação de novas conexões sinápticas
e até mesmo o crescimento de dendritos e axônios podem estar envolvidos na
formação do engrama.
Localização:
Diferentes tipos de memória têm
engramas distribuídos por diferentes áreas do cérebro, como o hipocampo
(memória episódica), o córtex pré-frontal (memória de trabalho) e os gânglios
da base (memória procedimental).
BASES CIENTÍFICAS E
DESCOBERTAS
Pesquisas recentes têm aprofundado a
compreensão dos engramas neurais. Estudos utilizando técnicas avançadas, como a
optogenética, permitiram a identificação e manipulação de células específicas
associadas a memórias particulares.
Por exemplo, ao ativar neurônios
específicos ligados a uma memória de medo em camundongos, os cientistas
conseguiram induzir comportamentos associados a essa memória, mesmo na ausência
do estímulo original. Esses achados reforçam a ideia de que memórias são
armazenadas em padrões específicos de atividade neural.
APLICAÇÃO NA
PSICOTERAPIA
A compreensão dos engramas neurais tem
implicações significativas para a psicoterapia, especialmente em abordagens
voltadas para o tratamento de traumas e transtornos de ansiedade.
Terapias como a Terapia de
Dessensibilização e Reprocessamento por Movimentos Oculares (EMDR) e a Terapia
de Exposição buscam modificar engramas associados a memórias traumáticas,
promovendo a reconsolidação de memórias de forma menos perturbadora.
Além disso, intervenções baseadas em
neurofeedback e estimulação cerebral não invasiva têm sido exploradas para
influenciar a plasticidade sináptica e, consequentemente, os engramas neurais,
visando a melhoria de sintomas em diversos transtornos mentais.
A UTILIDADE DO
CONHECIMENTO SOBRE ENGRAMA NEURAL NO MANEJO PSICOTERÁPICO E NO DIA A DIA
O conhecimento sobre engramas neurais
pode beneficiar tanto profissionais da saúde mental quanto indivíduos em seu
cotidiano.
Na psicoterapia, compreender como as
memórias são armazenadas e podem ser reconsolidadas auxilia na formulação de
estratégias terapêuticas mais eficazes, permitindo a ressignificação de
experiências traumáticas e a criação de novos padrões cognitivos mais
saudáveis.
No dia a dia, esse conhecimento pode
ser aplicado na melhoria do aprendizado, na formação de hábitos positivos e na
gestão emocional.
Compreender que memórias podem ser
modificadas e reprocessadas ajuda as pessoas a reformular experiências
negativas, facilitando o autoconhecimento e o desenvolvimento de estratégias de
enfrentamento mais saudáveis para desafios cotidianos.
O FUTURO DA MANIPULAÇÃO
DOS ENGRAMAS NEURAIS
À medida que a pesquisa avança,
espera-se que a manipulação dos engramas neurais se torne uma ferramenta ainda
mais precisa para o tratamento de transtornos psicológicos e neurológicos.
Estudos recentes sugerem que será
possível apagar ou modificar memórias específicas, oferecendo novas abordagens
para o tratamento de traumas, fobias e transtornos de estresse pós-traumático.
Além disso, o uso de inteligência
artificial e técnicas de estimulação cerebral poderá permitir a reativação
seletiva de engramas positivos, ajudando no tratamento de depressão e outros
transtornos afetivos.
Outra perspectiva promissora envolve a
reabilitação cognitiva de pacientes com doenças neurodegenerativas, como o
Alzheimer, através do potencial reativação de engramas adormecidos.
A combinação de neurotecnologia e
terapia genética pode oferecer intervenções personalizadas para restaurar
memórias perdidas ou reforçar habilidades cognitivas comprometidas.
CONCLUSÃO
Os engramas neurais desempenham um
papel central no funcionamento do cérebro, pois representam a base física das
memórias, formando as fundações dos processos de aprendizagem, recordação e
adaptação comportamental.
A cada nova experiência vivida, o cérebro
reconfigura suas conexões neuronais, criando uma rede de memórias interligadas
que podem ser acessadas e modificadas ao longo do tempo.
Compreender o mecanismo dos engramas neurais não
só ajuda a esclarecer como as memórias são armazenadas e recuperadas, mas
também abre portas para tratamentos mais eficazes e personalizados no campo da
saúde mental.
O avanço das pesquisas científicas, especialmente
com o uso de tecnologias como a optogenética, possibilita agora a identificação
precisa de células e circuitos cerebrais responsáveis pela formação e
recuperação de memórias específicas.
A nova era de descobertas não apenas amplia o
entendimento sobre como o cérebro funciona, mas também fortalece a
aplicabilidade dos engramas neurais em diversas terapias psicológicas, como as
que tratam de traumas e transtornos de ansiedade.
A Terapia
de Dessensibilização e Reprocessamento por Movimentos Oculares (EMDR) e outras
abordagens de reconsolidação de memória baseadas na modificação dos engramas
oferecem uma forma promissora de tratar memórias perturbadoras, facilitando a
reconfiguração de experiências traumáticas e promovendo uma recuperação mais
saudável.
Além disso, as possibilidades futuras de manipulação dos engramas, como a modificação de memórias específicas ou a potencial reativação de memórias adormecidas, oferecem novas perspectivas no tratamento de distúrbios neurodegenerativos e psiquiátricos.
Tecnologias emergentes, como a inteligência
artificial e estimulação cerebral, têm o potencial de reverter danos causados
por condições como o Alzheimer e depressão, trazendo grandes avanços para a
reabilitação cognitiva e emocional.
No campo da psicoterapia, o
conhecimento aprofundado sobre os engramas pode não só aprimorar intervenções
terapêuticas, mas também transformar a forma como lidamos com as memórias no
cotidiano.
A prática de ressignificar memórias
negativas ou de criar novos hábitos com base na reconfiguração neural abre
novos caminhos para o autoconhecimento e o desenvolvimento pessoal.
Portanto, a pesquisa e manipulação dos
engramas neurais não são apenas um avanço acadêmico, mas também uma ferramenta
vital para transformar vidas, oferecendo novas possibilidades para a saúde
mental e o bem-estar geral.
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